SE CADA NOITE É NOVA SOMBRA, CADA DIA É NOVA LUZ

O Sutra Imutável, de Buda, diz: Os fenômenos da vida podem ser comparados a um sonho, a um fantasma, a uma bolha, a uma sombra, a uma orvalhada cintilante ou a um raio luminoso, e como tal deveriam ser contemplados.

Com o fim de superarmos estado de angústia e amargura que porventura nos envolva o coração, precisamos transcender certa lógica de vida que nos tem servido de diretriz até então, pois ela construiu dissabores.

Dentro desse raciocínio, lemos as anotações do notável físico Albert Einstein, facilitando o entendimento: Os problemas significativos que enfrentamos não podem ser resolvidos no mesmo nível de pensamento em que estávamos quando os criamos.

O contexto de sofrimentos, quando nos parece inesgotável e sem saída, de idas e vindas, com momentos de alegria e outros mais de tristeza, se assemelha ao Samsara, a Roda da Vida, que pode ser associado a um não lugar, onde estamos, mas sem comodidade; buscamos algo e o achamos, mas ele não nos pertence; encontramo-nos em situações agradáveis, mas não identificamos o Bem. É estar sentindo não estar. Estar, mas se autoconvidando a sair.

Inconstância que traz desassossego.

*

O monge perguntou ao Mestre:

— Como posso sair do ‘Samsara’?

O Mestre respondeu:

— Quem te colocou nele?

*

Atentemos para o fato de que comprido e curto, alto e baixo, bonito e feio, bom e ruim, angústia e alívio, amargura e prazer, sombra e luz, e o que mais comparemos em dualidade, um depende do outro para existir com significado.

Lao Tse, o grande sábio chinês, em o livro Tao te King, escreveu:

Se todos na Terra reconhecerem a beleza como bela, desta forma já se pressupõe a feiúra.

Se todos na Terra reconhecerem o bem como o bem, deste modo já se pressupõe o mal.

E continua no mesmo Aforismo II:

O fácil e o difícil se complementam.

O longo e o curto se definem um ao outro.

O alto e o baixo convivem um com o outro.

A voz e o som casam-se um com o outro.

O antes e o depois se seguem mutuamente.

Se nos vemos angustiados por alguma coisa, por alguém, por alguma incerteza, também antevemos o que nos dará alívio.

No entanto, em situações assim, damos tamanho sentido à angústia, que nos vemos sem força, sem ânimo, sem coragem, para ir ao encontro do alívio antevisto.

Por óbvio, a angústia só permanece angústia enquanto não conseguirmos o que nos dará sossego.

Apesar da obviedade, por que não aplicamos a energia para viabilizar o sossego tão desejado?

Por que esse apego ao negativo até a exaustão?

Por que o desejo ainda não foi suficientemente forte para acordar a vontade.

O sofrimento, o negativo – que traz em si a semente do positivo -, é impermanente, como tudo o mais. A sua permanência mais ou menos prolongada depende de nós, somente.

Antigo provérbio indiano pede reflexão: Quando você estiver muito feliz, ou muito triste, lembre-se: isso também vai passar.

O Sutra Imutável sublinha que ‘os fenômenos da vida podem ser comparados a um sonho’… do qual acordaremos,

Para uma vida consciente, desperta, comecemos por imprimir em nossa consciência que a atração pelo que é bom combina com o distanciamento do que não é bom, e passemos de imediato a contemplar os fenômenos da vida, como recomendado por Buda, a uma sombra, a uma orvalhada cintilante ou a um raio luminoso, tendo a duração e o significado que nós lhe dermos.

Trabalhemos em nós o desapego de pensamentos, hábitos, sentimentos que nos façam tensos, irritados, culpados, envergonhados, que nos mantêm ligados ao polo negativo, e, também, de desejos, aspirações, projetos, por mais encantadores que sejam, que sabemos jamais se realizarão, apenas alimentam ilusão.

Leciona o axioma chinês: O destino lhe atira uma faca. Cabe a você decidir se a pegará pelo cabo e a usará a seu favor ou se a pegará pela lâmina e se cortará.

Precisamos ligar intencionalmente nosso mundo mental, emocional, sentimental, ao polo positivo do existir, para alcançarmos o bem viver.

Uma antiga parábola indiana em que uma carruagem puxada por seis cavalos está passando por uma estrada. De dentro da carruagem uma voz sussurra: “Pare”. O cocheiro se surpreende, nuca antes ouviu essa voz. Ressentido, ele apressa os cavalos. De novo, uma voz de dentro da carruagem sussurra: “Pare”. O cocheiro se sente ainda mais consternado e chicoteia os cavalos com mais força. Mas lhe ocorre que ele jamais conheceu o dono da carruagem, e esse dentro dela deve ser o dono. Ele puxa as rédeas, e a carruagem trava.

Na parábola, o cocheiro é o ego, os seis cavalos sãos os cinco sentidos e a mente. Só quando param é que eles reconhecem que a alma é quem manda.

Nós somos os seres pensantes, que construímos nosso campo mental, que acionamos o cérebro, gerando pensamentos.

Somos os artífices de nosso hoje, que será a base do nosso amanhã, do mesmo modo que fomos os que construímos o nosso ontem.

A vida e o viver é como se fosse uma grande gleba de terra que nos foi entregue com o compromisso de fazermos dela um recanto de fartura. Exige o preparo do solo, a escolha da semente, o trabalho de semear e cuidar da germinação, acompanhar a floração, a frutificação, a colheita, o armazenamento e o uso e distribuição. Em todas as etapas, se pede ação direcionada.

A consciência, que somos nós, está usando nosso cérebro para criar o mundo que estamos vivendo.

Ou construímos o nosso mundo como nos seja melhor ou outro o fará, e nos veremos condicionados a vivermos no mundo que o outro criou.

Nossa realidade existencial é limitada àquilo de que nós temos consciência e que vivenciamos.

Tem a ver com o que pensamos que é, lá no fundo, nossa identidade.

Há tanto de boas ofertas da vida recusadas por nós, do mesmo modo que tantos apelos nos seduzem.

Tantos são os convites para a renovação de votos pelo bem-estar, e ainda nos colocamos entrincheirados às voltas com o que satisfaz, mesmo que não contribua com que é bom para nós.

Não prestamos atenção de que o que resistimos, persiste.

A impermanência de aspectos da vida vai sendo constatado à medida em que olhamos para dentro de nós e avaliamos o nosso viver, classificando-o conforme a perspectiva, o significado e o propósito que lhe devotamos e o que desejamos para nós, devendo ser considerado nessa equação existencial, o amor, a autovalorização, a segurança vivencial e a satisfação que plenifica.

Amor, autovalorização, segurança e satisfação é um processo, é uma marcha, é um modo de fazer as coisas. Se entrarmos em marcha, descobriremos que essas coisas estão dentro de nós mesmos, não precisam ser conquistadas no exterior, são desenvolvidas no íntimo, pois em nosso íntimo já residem em germe.

Vem recitado nos Upanishads, textos que derivam do mais antigo texto hindu, os Vedas, que formam a base de toda a filosofia do hinduísmo:

Senhor!

Ajuda-me a transitar da treva para a luz;

da mentira para a verdade;

e da morte para a imortalidade.

*

Aquietando nossa mente, busquemos o nosso Eu real, nossa verdadeira identidade.

A brecha da inconsciência é onde corta o fio da espada, diz a tradição Zen

Despertemos para vida!

Permitamos a expansão de nossa mente. Acordemos a consciência para vivermos conscientemente, lúcidos.

Trabalhemos a autossuperação. Busquemos o que é de fato saudável, o elixir do bem-estar duradouro, a cura de nossos males.

A cura é sempre possível através da consciência pessoal, a começar pela convicção de que queremos nos curar e merecemos isso.

O reconhecido fundador da psicologia analítica, Carl Jung, declarou: Só aquilo que somos realmente tem o poder de nos curar.

*

Um Mestre oferece um melão a um discípulo, e pergunta: — Que te parece o melão? Tem bom gosto?
— Sim, sim! Muito bom gosto! – responde o discípulo.
O Mestre, então, faz outra pergunta: — O que tem bom gosto: o melão ou a língua?

*

Se cada noite é nova sombra, cada dia é nova luz.

O título de nosso artigo sugere esperança, reconhecimento de uma lei natural, a complementariedade que forma a vida, o consolo, a dinâmica da realidade, convite à tolerância e à paciência, lembrança de que precisamos acompanhar o fluxo contínuo da vida saudável, despertar da consciência. E nos convida à profundas reflexões.

Não há evolução sem revolução.

O convite é para revolução silenciosa, no íntimo do coração, onde reside a dama, Identidade Real e se encontra a pira, com a chama Consciência.

Quando nossas forças morais internas prevalecerem, o inimigo, o risco externo não penetrará.

Aprendemos com o Mestre por excelência que onde estiver nosso tesouro, ali estará nosso coração.

Não sigamos o passado; não nos percamos no futuro. O passado não existe mais; o futuro ainda não chegou.

A sabedoria ancestral forjada pelos anciões indianos recomenda-nos: Goze este dia porque é a vida. A própria vida da vida. Em seu breve transcurso, você encontrará todas as realidades e verdades da existência: a sorte do crescimento, o esplendor da criação, a glória do poder. Porque o ontem é só um sonho e o amanhã, só uma visão. Porque o hoje, bem vivido, faz do ontem um sonho de felicidade e, de cada manhã, uma visão de esperança.

Observando profundamente a vida como ela é e como deveria ser, aqui e agora, é que permanecemos equilibrados e livres, se nosso viver estiver em harmonia com a energia reinante no bem viver, e com a energia do Grande Todo, como nos inspira a Natureza.

O célebre pacifista e batalhador pelos direitos de igualdade, Martin Luther King, levantou-se em sua tribuna emanando convite à renovação interior e mudança de conduta mental, concitando-nos a amadurecida reflexão: Cada dia é o dia do julgamento, e nós, com nossos atos e nossas palavras, com nosso silêncio e nossa voz, vamos escrevendo continuamente o livro da vida. A luz veio ao mundo e cada um de nós deve decidir se quer caminhar na luz do altruísmo construtivo ou nas trevas do egoísmo. Portanto, a mais urgente pergunta a ser feita nesta vida é: O que fiz hoje pelos outros?

E acrescentamos nós: e o que estamos fazendo por nós próprios?

Nada retém o alvorecer!

Levantemo-nos e caminhemos em direção à luz de um novo dia, reconfigurando nossos ideais.

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Projeto INOVE – a vida sob novo prisma

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