Remoto conto indiano, fala do Pacificador de Feras, lendário personagem que habitava as pradarias, repleta de tigres, serpentes e outras feras.
Nos arbustos de média altura, que os olhos normais dos humanos nada podiam ver, era o habitat dessas feras, que ali caminhavam sorrateiras, protegidas pela grama alta.
As caravanas que por ali tinham que passar, guardavam grande receio. Muitas preferiam circundar aqueles lugares, mesmo tendo que alongar em muitos quilômetros e muitos dias mais o percurso.
No entanto, havia um homem que habitava essas pradarias e era o primeiro a ser procurado pelos caravaneiros, antes de qualquer partida, pedindo-lhe fosse o guia na viagem: o Pacificador de Feras.
Tinha o dom e o poder de, respeitando, se fazer respeitar por qualquer animal e fera que encontrasse pelo caminho.
Sempre que aceitava o convite, lá ia ele bem à frente dos caravaneiros, montado em seu robusto e pacato elefante, que levava o seu senhor com passos cadenciados, lentos e seguros, em constante abano de suas grandes orelhas.
O Pacificador, a cada momento em que se deparava com uma fera, fosse tigre, cobra ou qualquer outro, tocava em sua alimária, que bem adestrado, parava e levantava sua enorme perna direita para, como um degrau, auxiliar a descida dele.
Com um primeiro gesto de reverência e respeito em direção à fera, baixando ligeiramente a sua fronte, em voz alta pedia licença ao bicho para mais se aproximar dele e caminhar em território de seu domínio e habitação.
Após um instante, como tendo recebido a autorização pedida através de um mágico diálogo, num silêncio que ninguém via ser quebrado, ele ia até bem próximo da fera e os dois se fitavam por um breve tempo, como duas almas conhecidas de longa data que, reencontrando-se, conversavam, amistosamente.
E o inusitado sempre se dava. A cobra saia da posição de preparo para o bote, e, depois de mais um ligeiro olhar, quase como um “até breve, meu amigo”, serpenteava em retirada, calmamente, enquanto o Pacificador fazia o gesto de também baixar a sua fronte. Os tigres? Dizem as tradições que, após o diálogo, todos viam, surpresos, que ele se despedia, baixando a cabeça e as duas patas dianteiras em direção ao Pacificador, e este, por sua vez, baixava a fronte, em sinal de gratidão e respeito permanente.
E a caravana prosseguia em segurança, sob a orientação do consagrado guia.
Nesse tempo as feras falavam.
E, de quanto em quando, elas se reuniam em clareiras, protegidas pelas árvores, as mais velhas ensinando as mais jovens sobre a vida e os segredos da sobrevivência. E, diante da repetida curiosidade dos mais jovens quanto aos encantos do Pacificador das Feras, também muito conhecido entre elas, as feras-anciãs resumiam a relação como se dando de coração a coração, de uma fala entre iguais, pois o Pacificador não as via como feras, apenas como irmãos, que se encontravam aqui e acolá, em dado momento. O mesmo acontecia por parte dos animais, que viam e sentiam nele a energia da identidade, vibrante de respeito e sinceridade. Continuando a lição, as feras-anciãs revelavam que ele sempre chegava anunciando ali estar em nome da paz, e se despedia desejando que a paz sempre ficasse entre nós, ele levando da paz, somente a parte que a ele competia guardar, zelar e distribuir ao longo do caminho que seguiria …
E diz a lenda, que quando o Pacificador se aproximava de alguma fera, dele partia em direção a ela, jatos de luz multicolorida, cujos raios eram recamados de brilhantes pontos que faiscavam sob a luz do Sol ou mesmo da Lua, como que purpurina soprada por suave brisa. E essa luz era rapidamente absorvida pelo bicho, que se fazia dócil e receptivo, pois simples já era.
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Comentam alguns para além da lenda, que o Pacificador, abençoado por Brahma – o Criador do Universo, o Equilíbrio na Trimurti (trindade dos deuses) -, ganhou a eternidade e o poder de estar em diversos lugares ao mesmo tempo, e lhe foi depositado em cada uma de suas mãos, os poderes de Vishnu e de Shiva, representando as forças opostas da conservação e da destruição, respectivamente, e no centro, com o encontro cósmico dessas deidades, imperando o equilíbrio. Conduzindo para esse centro de equilíbrio, sob seu domínio, ali o Pacificador deveria ensinar a humanidade a louvar a “deusa” Paz, reverenciando-a em suas vidas, expressando seus poderes pacificadores, em cada pensamento, em cada palavra, em cada movimento, em cada ação.
A Paz, disse Brahma ao Pacificador de Feras, é a fala entre iguais, é o começo, o meio e o fim. É, não o elo, mas o envolvimento. É o reflexo do amor formado de uma só alma, habitando em dois corpos. É onde está o silêncio dos desejos e sonhos de cada um, para que todos possam ouvir, em silêncio, o sublime encontro com o coração da natureza, onde se dá a Unidade sentida e consentida de um para com todos, e todos para com um, integrando-se, enfim, com Unidade Primordial.
Vá, Pacificador, e visite o coração do Homem.
Diga-lhe que a sabedoria do Bem deve ser adotada pelo que ela pode fazer por cada um, não pela maneira como soa; deve a sabedoria modificar a vida e torná-la forte e saudável.
Hora de esquecer as ilusões e se posicionar firme com o que é e com o que deva ser.
As Caravanas do Bem precisam percorrer ainda os desertos, as savanas, as pradarias dos sentimentos humanos, repletos de “feras”: o egoísmo, o orgulho, a vaidade desmedida, a ignorância, a prepotência, a ganância, a usurpação, a violência, a indiferença, o descaso, a maldade da omissão, e muitas mais.
São “feras” com grande resistência, alimentadas pelas próprias mentes de cada um, com as quais se comprazem.
Aqui, disse Brahma ao Pacificador, você use os poderes consagrados à Shiva, conforme a conveniência. Ali será a vez de Vishnu. Ambos os deuses estão para reconduzir os Homens aos caminhos seguros, em cujas trilhas você estará à frente, demarcando aquelas que poderão ser caminhadas com segurança, onde a Paz então terá deixado marcas profundas no chão.
Pode anunciar que, ao final da jornada redentora de cada um, Krishna os estará esperando, coroando-lhes o êxito com a permissão de se refrescarem na fonte de tudo e de todas as causas, de igual para igual com a água da sabedoria e da paz.
No entanto, Pacificador – continuou Brahma -, sei que a sua missão lhe exigirá longa caminhada, por diversos caminhos e lugares. Você encontrará corações endurecidos, magoados, sofridos. Também povos em guerra, mortandade indiscriminada, crianças, mulheres, velhos. Sítios com milhares de refugiados, ressentidos e odientos. Mas sempre haverá aquele que está cansado de sofrer, aquele que anseia por dias melhores, aquele que deseja mudanças para melhor. Por isso anuncie que a Paz existe e pode ser alcançada. Paz você é, há Paz desejada. Igual fala com igual.
Há muitos corações que esperam por sua chegada. Que sejam realmente muitos o que deem ouvidos ao seu chamado.
Também sei que os que se proponham caminhar, seguindo suas pegadas indicativas do caminho a seguir, encontrarão muitos obstáculos à frente. Diga-lhes, Pacificador, que poderão, então, contar sempre com Ganesha, pois dei-lhe o poder divino de removedor de obstáculo, liberando caminho aos de boa vontade.
Sim, respondeu Brahma à pergunta sem palavras do Pacificador, eu sei que os maiores obstáculos para a renovação íntima estão dentro de cada consciência.
Antevendo essa dificuldade, designei Hanuman, para fazer parte da Caravana do Bem. Ele carrega a ausência total do ego, do eu inferior. Conhece o pensamento humano, que pula igual macaco para um lado e para o outro, de galho em galho, desejando as coisas sem valor e comprometendo-se com inumeráveis atividades que distraem a paz interna. Ele irá ensinar aos de real interesse, que a mente pode viajar aonde desejar, na velocidade do pensamento. Pode também se expandir em direção ao infinito. Porém, enquanto ela permanecer apegada as paixões animais e aos sentidos que consomem as melhores energias vitais, permanecerá instável, causando distúrbios. Mas, uma vez que se entregue à Paz interna, e se dedicar a ela, disciplinadamente, pode chegar a manifestar poderes benéficos inimagináveis, iguais ao próprio Hanuman.
Pacificador, Pacificador, seus questionamentos têm respostas. Pensei além, disse-lhe Brahma.
O sofrimento, se não for bem entendido e bem sorvido, dele tirando as melhores lições para vida, a fim de se aprender como bem viver, para que coisa pior não aconteça, se faz verdadeiro fantasma no coração humano, como um demônio perturbador e um verdadeiro terrorista interno, qual o pessimismo, em que tudo que seja proposto, de antemão considera que não será possível.
Durga – barreira que não pode ser derrubada – irá ao seu lado, deusa invencível, é guerreira e sabe combater demônios internos.
Protegerá aos seus devotos dos demônios do mundo e removerá os mistérios.
Os seus três olhos darão segurança aos caminhantes. O olho esquerdo representa o desejo (lua), o olho direito representa a ação (sol), e o terceiro olho (ponto vermelho no meio da testa) representa a sabedoria (fogo).
Os fantasmas do medo, do comodismo, do pessimismo e mais outros tantos, que habitam corações invigilantes, se estes desejarem fortemente a mudança, Durga os expulsará, dando condições para que prossigam na jornada.
Naturalmente, Pacificador de Feras, condutor da Paz nessa sua nova missão, agora junto aos Homens, em nome do auxílio na pacificação das “feras” íntimas, nada se alcança em glória, se não houver sacrifícios.
Não se trata de sacrifício, padecimento, martírio, mas de tornar sagrado os ditos, os feitos, os tempos, as ações.
A Caravana do Bem não estaria repleta de recursos, sem a presença de Rama.
Como você sabe, Rama, avatar de Vishnu e marido de Sita, é um símbolo de sacrifício, um modelo de fraternidade, um administrador ideal, e um guerreiro incomparável. A essência da Rama é, portanto, a essência da excelência em cada exercício.
Rama é o exemplo supremo de como as pessoas devem se comportar no mundo, como um país deve ser governado, como a integridade e moralidade dos seres humanos devem ser protegidos. Ações elevadas, qualidades ideais e pensamentos sagrados são fundamentos básicos de caráter. Rama é a própria personificação destes três atributos.
O Princípio de Rama é uma combinação do divino no humano e do humano no Divino. A inspiradora história de Rama apresenta o código de ética tripla relativa ao indivíduo, à família e à sociedade. Se a sociedade está progredindo bem, a família também estará feliz, harmoniosa e unida. Para a unidade na família, os indivíduos que a compõem devem ter um espírito de sacrifício.
Ele será o grande exemplo, estimulador do progresso, com lutas, sim, mas com conquistas como resultado.
Ademais, Pacificador, compomos a Trimurti, e estamos fazendo parte de você.
Eu, Brahma, estou com os Homens desde a criação. Sou o Equilíbrio, como é sabido.
Vishnu, é o deus protetor, leva em si, além de outros atributos, por ser o que é, a consciência de todos os seres; é a autoridade suprema; é energia capaz de fazer o possível e o impossível e capaz de suportar qualquer coisa, por ser a força, apesar de fadiga ou cansaço que chegue; é, em esplendor, autossuficiente; e enquanto vigor, é capaz de manter a imaterialidade, daí retirando tudo o que precisamos.
Com Shiva, que apresenta sua dança divina capaz de destruir o que for necessário no universo, preparando minha atuação em todo o processo de criação. Que, nessa missão, será criar condições para a instalação da Paz nos corações dos Homens, definitivamente.
Segue adiante, Pacificador, com coragem, destemor e ousadia. Abra caminho para a Paz.
Prossiga contando com a força de todos os deuses com você, pois eles sempre estiveram, estão e estarão intimamente presentes e interligados com cada ação benéfica e útil de cada homem nas relações humanas, de cada um consigo mesmo, de cada um com o próximo, de cada um com a Consciência Cósmica.
A Paz e o Amor imperarão nos corações dos Homens, em alguns desde agora, em outros logo mais. Confie e prossiga.
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Escrevemos sobre os sonhos de um novo mundo, que muitos de nós acalentamos e muitos já empregamos nossos melhores esforços na sua construção em nosso continente do coração.
Escrevemos sobre os obstáculos inerentes à vida e às conquistas que alcançaremos.
Escrevemos sobre as virtudes que um dia teremos.
Escrevemos sobre a Paz, a mensagem universal que um dia de igual falará com igual, fazendo dos Homens unos entre si, amálgama que juntará os fragmentos da Unidade, que permitirá nossa união com o Todo.
E, intencionalmente, nos utilizamos de deidades milenares, as quais personificam exatamente nossos sonhos de agora e detém os recursos necessários para as realizações, como seus atributos, desejando, com isso, facilitar nossa visão da vida, sem preconceitos, sem falsos purismos, sem bandeiras separatistas, que tantas vezes nos impedem de ver a Verdade em sua verdadeira grandeza, quer nos sejam trazidas por gurus, por deuses, por santos, por filósofos, por cientistas, por doutrinas, por religiões, por seitas, por agremiações, por sociedades e irmandades, desde que voltadas ao Bem.
Mitos, mitologias, deidades, crenças. Tudo e todos falam a mesma verdade, com linguagem diferente.
Abramos nossas mentes e aprendamos a ver além da curva, para além do horizonte comum, retirando da letra o espírito dela nela contida, e com esse espírito, alimentemos nosso mundo mental, pois é desse nosso mundo mental que retiraremos o como viver no mundo de todos… mas, que seja com acerto, justeza, fraternidade, solidariedade, bondade e amor.
Retirando as figurações próprias de uma milenar e respeitável cultura, encontramos a essência do que precisamos como princípio ativo de nossas devidas ações para sermos feliz.
Essência de vida e para uma vida feliz, é o de que carecemos, tanto quanto o deserto anseia pela dádiva da água, que venha sustentar as vidas que ali vivem, superando a agrestia do entorno.
Demos as boas-vindas às nobres lições que nos cheguem dos mais diversos povos, tempos, tradições e culturas, que chegam vestidas das mais belas e coloridas vestimentas que a linguagem dos homens comporta, enriquecendo a mente, o coração e o imaginário dos povos.
A essência do bem e da verdade é que sustentará a nossa caminhada rumo à Essência de Tudo e do Todo.
A forma é apenas moldura. O conteúdo é o mais importante.
Opte pela Paz. Faça-se um Pacificador!
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Projeto INOVE – adotando todas as línguas, para falarmos uma só língua: a da Paz
www.projeto-inove.com.br