Inicialmente há apenas o líquido neutro, que servirá de base e veículo dos elementos que comporão um perfume pretendido. Cada perfume, conforme as substâncias aromatizantes que o compõem, apresenta, como resultado, sua fragrância própria, sua individualidade, o que o distingue dos demais perfumes. Variações das substâncias, fragrância diferente.
A mistura, portanto, pede precisão de detalhes em natureza, quantidade e qualidade de cada substância, bem como de local, temperatura, tempo e manuseio, além da assepsia dos utensílios e material auxiliar.
A preciosidade da criatividade humana produz os mais variados aromas, despertando em nós as mais diversas sensações, conforme sejam as associações que fizermos com seus respectivos significados para nós: bem-estar, frescor, alegria, desejos, ânimo e outros mais, tão diversos como diversos são os perfumes.
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Indivíduos que somos, vamos compondo nossa individualidade a cada momento-vida, absorvendo as substâncias reunidas dos conteúdos psíquicos, transformados em atos, experiência, realizações, decorrentes do ambiente, das circunstâncias, da vida de relações pessoais, familiares, sociais, e reminiscências do passado mais ou menos próximo.
Tanto íntima quanto externamente, são essas substâncias assimiladas que respondem pelo nosso comportamento, e nos molda em caráter especial, particularidade ou originalidade, distinguindo-nos uns dos outros.
Por exemplo, o hábito e o cultivo dos pensamentos degenerativos e viciosos, de qualquer natureza, tornam-se as substâncias que formam a personalidade doentia, em desequilíbrio consigo própria e com o seu entorno, moldando-lhe uma realidade, que é relativa, mas que perdurará enquanto houver uma retroalimentação com as mesmas substâncias desequilibradoras.
O inverso é verdadeiro. Hábitos e cultivo de pensamentos revigorantes, construtivos, assertivos, positivos, são as substâncias que formam a personalidade sadia, plena de bem-estar.
O caminho que desce e o caminho que sobe são os mesmos, recorda-nos Heráclito de Éfeso, notável pensador da antiguidade. Como podemos optar, por que não optarmos pelo caminho conducente a paz?
Quer seja pela exaustão dos sentidos, pelo enfado dos lazeres, pela agudeza dos sofrimentos, pela insatisfação existencial, pelas ilusões relacionais, ou, então, pelos bons exemplos, pelo entendimento de aspectos relevantes do existir, pela aceitação de novos e promissores rumos, ou seja, pela dor ou pela compreensão, despertamos um dia, como de um longo sono, e notamos que a vida nos tem ensinado e nos convidado a mudanças, acenando com o bem-estar.
A partir daí, naturalmente vai se dando transformação de hábitos mentais, com o cultivo de novas ideias, substituindo as perturbadoras por outras saudáveis, levando a alterações de buscas, de gostos, de prazeres, dando-se lugar ao que condiga com a nova realidade plenificadora.
Geramos desidentificações de conteúdos negativos e precisamos criar novas formulações e identificações com tudo o que for inerente a um pensar, sentir e agir, refazentes, revigorantes e promotores do bem-estar almejado, no seu sentido amplo.
A individualidade vai se despojando dos invólucros falsos da personalidade, retirando máscaras de conveniência e oportunismo, paixões dissolventes, apegos, ilusões, sentimentos inferiores, trabalhando pela conquista de uma nova natureza íntima, onde os novos hábitos são formados com substâncias que exalam paz e bem-estar, alegria e satisfação em estar vivo e sentir-se vivo.
A isso dá-se o nome de individuação, que, figuradamente, é como um preencher de nós mesmos com as melhores fragrâncias que a vida enseja. É um crescimento interior com plenitude, elevando-nos o nível de consciência a patamares superiores, com esforço, sempre e continuamente, onde deixaremos de ser individualidade para vibrarmos em unidade, sincronizados com o Todo, a Consciência Universal.
Quase todo o segredo dos grandes corações está nessa palavra: perseverança. A perseverança está para a coragem como a roda para a alavanca: é renovação perpétua do ponto de apoio, sublinhou Victor Hugo, o notável escritor francês.
A semelhança de um perfume em produção, como indivíduos, somos aqueles que serviremos de base e veículo dos elementos que comporão um perfume pretendido.
À medida que optamos, adotamos e assimilamos as substâncias – vivência, experiência – vamos compondo a individualidade, a originalidade da individualidade-perfume.
Num rápido autoexame de consciência poderemos qualificar o perfume que hoje somos e considerar as sensações que causamos nos outros.
No entanto, importa saber que o Excelente Perfumista reservou para nós as mais sublimes fragrâncias, que irão fazer de nós os mais preciosos perfumes.
A melhoria e aprimoramento da fragrância existencial acontecerá:
Quando nos decidirmos a não mais sermos quais espelhos impessoais, que, sem identidade, refletimos somente os outros, e se no espelho nos miramos, vemos diante de nossos olhos quem não somos.
Quando nos decidirmos em reassumir com autocontrole nossa verdadeira identidade, dando-lhe, a partir de então, a transcendência do aroma do bem-estar no coração – a habitação da paz -, o qual temos o dever de vedar o acesso a tudo e a todos que não contribua com a nova natureza íntima, que agora vibra no mesmo diapasão do equilíbrio e da harmonia.
Quanto habitações – que bem fala dos nossos corações -, o notável poeta Gibran Khalil Gibran, anotou em seu livro O Profeta:
… E que objetos guardais atrás dessas portas trancadas?
Acaso possuís a paz, esse impulso tranquilo que revela vossa potência?
Possuís as recordações, essas abóbadas cintilantes que se estendem sobre os cumes do espírito?
Possuís a beleza que conduz o coração dos objetos confeccionados com madeira e pedra para a montanha sagrada?
Dizei-me, possuís tudo isso em vossas casas?
Ou tendes somente o conforto, e a cobiça do conforto, esse desejo furtivo que entra em casa como visita, e depois torna-se hóspede, e depois dono?
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