CORAGEM DE BEM VIVER

Disse o poeta, Khalil Gibran: Para viver, é preciso coragem. Tanto a semente intacta como aquela que rompe a sua casca têm as mesmas propriedades. No entanto, só a que rompe a casca é capaz de se lançar na aventura da vida.

O caroço do abacate transforma-se em abacateiro pelo automatismo já conhecido; nenhuma decisão ou atitude consciente é necessário. Em condições normais, simplesmente acontece.

Já a formação do ser humano, faz com que o homem ou a mulher dependam de decisões, da vontade, do compromisso consciente para conseguirem crescimento saudável, valor e dignidade pessoal.

A coragem é necessária para que o homem possa ser e vir a ser, pois precisa afirmar-se e firmar-se para que seja o que deseja.

Coragem significa ação do coração.

E a ação, para ser útil, proveitosa, há de ter um direcionamento, um sentido, um objetivo.

Muitas faculdades precisam ser desenvolvidas por uma vontade ativa e pela coragem orientativa, tais como, por exemplo, a razão, a inteligência, o entendimento e o sentimento.

Logo, há necessidade de um senso de propósito e de destino.

Barco que não tem rumo certo, nenhum vento lhe será favorável.

Na jornada humana, enquanto a coragem moral indica correção do que está errado, a coragem criativa levará à descoberta de novos rumos, novos valores, novas experiências.

O viver requer uma ousadia única: descobrir que não se poderá viver através da experiência dos outros; cada existência é diferente da outra, do mesmo modo cada experiência.

Quanto mais acentuadas as conquistas próprias na existência, quanto melhores aproveitadas cada experiência, mais ampla será a individualidade do ser, e se fará distinto do contexto comum da natureza humana, deixará o mesmismo adotado por muitos.

Se dará conta que havia perdido a noção de tempo e a lucidez para pensar na grandeza de que o ser humano – ele mesmo – se constitui.

O autodescobrimento facultará visão fundamental da natureza humana, em que cada ser tem quatro dimensões: mente, corpo, coração e consciência, ou espírito.

Para uma vida integral, cada uma dessas dimensões necessitará de atenção e nutrição de seus valores.

A mente precisará de espaço para a criatividade, o corpo pedirá cuidados, o coração viverá de emoções nobres, a consciência, ou o espírito, precisará ser ouvida em seus princípios para atendimento das necessidades humanas, e coordenará a mente, ordenará o corpo, zelará pelas emoções.

Cansado do longo baile à fantasia de todos os dias, decidirá pela realidade, pelo autoencontro consigo mesmo.

Voltará para a essência de ser humano, que é a capacidade de dirigir a própria vida.

Somente assim aquela personalidade conveniente que se manifestava para agradar aos demais, e agia em sentido oposto às aspirações pessoais acalentadas, mesmo contra seus pontos de vista, passará a desidentificar-se dos interesses programados por outras pessoas como se fossem seus.

Assumirá com coragem seus posicionamentos, sua vontade própria, seu autocontrole e a busca da autorrealização.

Se liberará do entediante automatismo repetitivo de uma vida sem significado, sem participação do brilho de sentimentos espontâneos e naturais, que neutraliza realizações e emoções vivificantes.

Permitirá o ressurgimento do acalentador quimismo das emoções restauradoras, encontradas no bom, no belo e no nobre.

Qual a semente que rompe a casca, se lançará na aventura da vida, no dizer do poeta.

Abrirá espaço mental para refazimento e renovação emocional.

Ajustará e visão para ver um estado futuro desejado com os olhos da mente.

Reconhecerá que a memória é o passado, portanto finita, e o passado não é mais.

A visão do novo estado desejado será infinita, pois é o futuro. Portanto, maior do que a história pessoal até o momento, da qual pode mudar os próximos capítulos e escrever um final feliz, sem as feridas emocionais do passado.

Entenderá a felicidade como a capacidade de subordinar o que se deseja agora ao que se desejará no final, que será a autorrealização.

Em outras palavras, subordinará o prazer de hoje em prol de um bem maior no longo prazo.

Fará escolhas conscientes que constroem a individuação.

Fará uso assertivo da liberdade de escolha, esse atributo essencial da consciência, que se manifestará entre o estímulo e a resposta, a ação e a reação.

O livre arbítrio reside no silêncio entre um pensamento e outro, dá forma e significado ao pensamento seguinte, até então desconhecido.

Por isso se dirá que o que é semeado, crescerá e obrigará a colheita.

A autorrealização será a substância da completude, que é o cerne da individuação.

O despertamento do ser para a sua individualidade é marco inicial para o desenvolvimento e amadurecimento psicológicos de todas as adormecidas potencialidades íntimas.

A dimensão eterna do ser se corporificará no uso da inteligência em favor próprio.

Aprender, viver, amar, deixar um legado, necessidades que fazem parte natural de um todo indivisível: o ser integral que somos, serão supridas com primazia.

A consolidação dessa integralidade do ser, no pensar, sentir e agir, será o alicerce da vitória sobre si mesmo.

Desperto:

no filho ou filha não vê apenas membro de família, mas irmão ou irmã de caminhada evolucionária;

a esposa ou o esposo deixa de ser apenas cônjuge, e assume o devido lugar de cocriador da felicidade comum;

a família se faz laço afetivo e recebe a bênção da união que estreita e sustém, e do amor que nutre e ampara;

a casa perde o lugar de simples moradia, e se revela lar que acolhe e protege, onde se reúnem almas que se empenham por se fazer um;

o trabalho assume o real sentido de sacrifício, termo que significa fazer sagrado o momento, a oportunidade;

o dinheiro é retirado do altar da cobiça, e vem como meio para se alcançar os fins nobres da vida e do viver;

o corpo deixa de ser idolatrado como veículo de exposição e sensualidade, e assume o seu lugar de veículo sagrado para a jornada de autossuperação e autorrealização;

o egoísmo é deposto e cede lugar ao altruísmo;

o próximo se faz mais próximo, e se assume ser uma luz, não um juiz, um modelo, não um crítico;

a fraternidade e a solidariedade ganham posição de cidadania no mundo íntimo e em suas manifestações exteriores;

os relacionamentos humanos se sintonizam com o saudável e o construtivo;

a afetividade, o zelo e o respeito assumem posto de primazia no trato com o próximo;

o sexo, função natural do ser, passa a ser responsável, e se fecha para os transtornos advindos com a promiscuidade;

as viciações de costumes e valores são reconhecidas como experiências mal sucedidas, e relegadas ao passado;

a liberdade não se aparta do discernimento;

a ética e a moral deixam de ser palavras, para terem significação relevante no pensar e no agir;

a alma deixa de ser figura de retórica, e se posiciona como ser pensante que somos, realidade existencial primacial.

Desperto e em franca jornada pelo caminho certo do desenvolvimento e amadurecimento psicológicos de todas as adormecidas potencialidades íntimas e infinitas, a vida transcende para além de simplesmente estar vivo e abre caminho para o bem viver.

Viver pede completude.

Completude é a alma da plenitude.

Plenitude é o finalismo da vida e do bem viver.

O momento é agora!

Rompamos a casca da semente da autorrealização, pois somos sim capazes, e nos lancemos, com coragem, com atitudes do coração, na aventura da vida, na edificação do bem-estar e da individuação.

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