Com a chegada do verão, os alunos ficavam mais tempo no pátio e nos jardins da escola, antes do começo das aulas do dia.
Na medida em que chegavam, formavam seus grupos aqui e ali, em conversa animada.
Na sombra de uma das árvores, os dois amigos falavam sobre escolha de profissão, cursos possíveis, dificuldades prováveis e, entre uma ou outra fala, lembravam-se que logo, logo, haveria grande mudança na vida cotidiana, pela força mesma das circunstâncias imaginadas.
Um deles, Augusto, comentou que para ele a expectativa maior não residia tanto nas novas exigências de um curso que optasse, mas, sim, na mudança de vida, diante desses compromissos novos, inclusive trabalho, estágio, cursos complementares.
Disse que cogitava adiar a continuidade dos estudos, a fim de examinar com mais tempo o que realmente desejava para o futuro.
Nisso viram que o professor chegava para o dia de aulas.
O professor os abraçou, afetuoso como sempre, e os cumprimentou pelo dia.
Antes de ir em direção ao prédio, falou: – Augusto, não pude deixar de ouvir seus últimos comentários. Como amigo, e não como quem chega e se intromete em assunto alheio, digo-lhe que, por um lado, é certo pensar em adiar, eventualmente, a continuidade dos estudos, se tenha dúvidas sobre que carreira escolher.
Mas, por outro lado, seria grande equívoco interromper o fluxo escolar contínuo, pelo simples fato de ter de se impor mudanças, mesmo que sacrificiais quanto a certos aspectos de sua vida cotidiana atual.
– Professor, meus pais terão muita dificuldade em arcar com os custos da escola superior, razão pela qual é que comentei a necessidade de eu trabalhar, a fim de prover o custeio das despesas, falou Augusto.
– No entanto, Augusto …
O professor se calou, pois ouviram a campainha que indicava o início das aulas.
Ele olhou com tristeza para seu amigo, pela interrupção.
Ambos pegaram as mochilas para entrarem, quando o professor, depois de pensar um pouco, falou ao amigo de Augusto: – André, por favor, vá até a nossa sala de aulas e diga aos demais alunos que, a meu pedido, venham todos aqui fora. Hoje a aula será diferente. O que tenho para falar, serve para todos.
Augusto e André sorriram, e o amigo acelerou o passo para chamar os demais colegas.
Instantes depois, todos bem a vontade, sentados nos bancos ou na grama do jardim, enlevados pelo frescor da manhã, pelo sol radiante, pela sala de aula improvisada, surpresos e atentos, rodeavam o professor, também sentado no chão e encostado no tronco da árvore.
Augusto e André eram os primeiros, bem próximo dele.
– Eu conversava com André e Augusto – começou o professor a falar com todos -, antes do início das aulas, e falávamos sobre a vida, suas exigências, mudanças, e achei melhor trocar ideias a respeito com todos vocês, até porque, algumas das dúvidas que martelam na cabeça dos dois, podem ser as mesmas para outros de vocês.
As exigências naturais de nosso progresso pessoal e coletivo, pedem mudanças em nossa forma de pensar, agir, relacionamentos, ambiente costumeiro, enfim, em muitos casos, há que se dar uma guinada de 180º em nosso estilo de vida.
Mudança impõe resistência.
Quanto maior a mudança, maior a resistência.
Porém, o olhar, inicialmente, deve estar para além das mudanças questionadas, a fim de enxergar com clareza o propósito almejado.
Uma pessoa sem propósito na vida é como um navio que zarpa e não tem porto de destino.
O propósito, quando valha a pena, motivará a superação de obstáculos.
Claro que falo de propósitos enobrecedores, enriquecedores de valores que geram bem-estar físico, moral e espiritual.
A intenção, o propósito, vem de dentro de nós, mesmo que estimulado por fatores externos.
Quando nos identificamos com o novo propósito, decidido por ele, valores atuais sofrem ressignificação.
Intencionalmente, então, iniciamos processo de desidentificação com o que seja fator impeditivo de passos evolutivos, e, juntamente, começa identificação com o que sustente e promova nossa caminhada rumo ao objetivo traçado.
Imagine uma camionete de transporte de cargas. Ela é carregada com aquilo que vai para certo destino. Quando chega, descarrega e está pronta para nova bagagem, de conformidade com o novo rumo a seguir.
Sem descarregar o que levava, não há como transportar novas mercadorias. Há um limite de carga previsto.
Também deve haver seleção rigorosa do que se reúne numa carga, em face dos destinatários.
Falar de desidentificação é falar em descarregar, tão logo possível, aquilo que já chegou até o seu destino.
Novo destino, nova carga.
Simples, não necessariamente fácil.
Isso mexe, em nossas vidas, com sistema de crenças, valores, comportamentos, premissas de vida, principalmente.
Um dos Sutras Iogas de Patanjali, diz: quando estamos inspirados por um grande propósito, um projeto extraordinário, todos os nossos pensamentos ultrapassam seus limites. Nossa mente transcende suas limitações, nossa consciência se expande em todas as direções e nos encontramos num mundo novo, grande e maravilhoso.
Vocês acompanham as ideias, até aqui? perguntou o professor.
Um dos jovens pediu licença e falou: – Sim, acompanho a ideia, mas confesso que, nesse primeiro momento, mudar interiormente de pronto é tarefa quase impossível para mim, penso.
Depois de pensar um pouco mais, o professor prosseguiu: – Notemos os bebês.
Não se prendem a velhas e desgastadas condições.
O que seu cérebro absorveu ontem passa a ser conhecimento adquirido, e auxilia, mas não dificulta, novas descobertas, que eles continuam em busca incessante. Não param, e reclamam se alguém os fizer parar.
O problema não é como levar para a mente ideias novas e inovadoras, mas como tirar de lá as ideias velhas que atravanquem raciocínios, dificultem conclusões e decisões, e cerceiem superações.
A partir da decisão tomada, a vontade firme passa a dirigir as emoções e pensamentos de modo a que sirvam como geratriz da nova realidade em construção.
Pouco adianta visualizar horizontes e manter-se parado.
Sabe aonde quer chegar? Analise o que precisará para conseguir isso.
– Pode exemplificar, professor, pediu André.
– Pense numa viagem que se pretenda fazer, começou a falar o Professor.
Terá de saber: quantos dias de viagem, o que precisará de roupa, produtos de higiene, dinheiro, documentos, ajustes de hospedagem, meio de transporte etc.
Isso é planejamento.
Bem planejado? Agora os preparativos, as providências, o provimento dos recursos pessoais.
Tudo arrumado na mochila das aptidões, habilidades?
Com determinação, pé na estrada evolucionária da vida!
Imprevisto e dificuldade que surjam, perspicácia na superação e persistência na continuidade.
Consultar regularmente o mapa da jornada renovadora, evitar desvios que atrasem e caminhos perigosos, e não perder de vista o destino.
Evitar apegos desnecessários, pois podem sobrecarregar, consumir forçar que devem ser empregadas para o fim proposto, para o êxito.
O propósito não estará no fim da redentora saga.
Ele deve estar presente desde o momento inicial da decisão tomada e seguir junto em cada pensamento, sentimento, atitude, palavra. Ele é fator motivador, estimulante.
Com seu olhar nos olhos de cada um de seus alunos, à sua volta, disse o professor: – O propósito é que fez acordar e encorajou o buscador de sonhos, que é você, você, todos vocês, a mover-se em direção ao porvir, disposto a realizar seus desejos, construir seu destino, em esforço continuado!
Você quer, você pode, você faz!
Desistir, jamais!
Ampliemos nosso raciocínio.
Olhemos a vida sob um novo prisma; identifiquemos sua significação e importância, razão e sentido, pois nesse caminho alcançaremos vida saudável e exitosa, física e moralmente.
O crescimento interior é um processo de libertação, que pede desidentificação com as paixões dissolventes, ilusões existenciais, sentimentos indesejáveis, manias desestruturantes, fixações emocionais destrutivas do ânimo e da coragem.
O bem-estar da alma está ao nosso alcance, desde que seja nosso propósito.
Ao elegermos uma vida saudável por objetivo, vamos dar o primeiro passo rumo a realização, sem tardança, e logo teremos dado dois mil.
Um único fio conduz a uma complexa tapeçaria. Un Royal Gabhet Tapis, monsieur!
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