A SINGULARIDADE DE CADA UM DE NÓS

Não conseguimos mudar coisa alguma sem antes aceitá-la. – Carl Jung

Estruturando nossa consciência com os pilares resultantes da experiência do aprender a conhecer, a ser, a fazer, a viver juntos, ela fará ponte para seus níveis superiores, até a transpessoalidade, e mesmo até o nível espiritual.

Segundo lição de Santo Agostinho, necessitamos um do outro para sermos nós mesmos.

A vida em comunidade, o viver juntos, em família e em sociedade, conclama-nos a que aceitemos que o “eu” é regido pelo “nós”.

O “nós” é composto de diversos “eus”, e cada um merece respeito e consideração. E que juntos se faz muito mais.

Para alcançar o conhecimento, acrescente coisas todos os dias. Para alcançar a sabedoria, remova coisas todos os dias, recomenda Lao Tsé, notável pensador chinês.

Ressignificando a vida com valores renovados pelas experiências edificantes, nos tornaremos novos e indivíduos cada vez mais singulares.

Um copo vazio significa apenas um copo vazio. Porém, no instante em que depositamos água dentro dele, muda o significado, passa a ser agora, copo com água. Sai da generalidade e se particulariza.

O mesmo com uma folha de papel. Se particulariza não só com escrita nela, mais ainda segundo a ideia, o sentido, o conteúdo do que for escrito. Teremos, figuradamente, como resultado e sua significação, páginas de luz ou de sombra.

Como indivíduos que somos, devemos nos oportunizar constantes reflexões a nosso respeito, examinando quanto e qual significado damos a nós mesmos e ao nosso viver e conviver, avaliando o esforço que fazemos para sair do geral, particularizando-nos paulatina e constantemente, edificando singularidade harmoniosa.

Meditemos, por exemplo, sobre a aspiração que todos temos de bem-estar contínuo, em todos os aspectos de nossas vidas.

O bem-estar, por sua vez, para ser alcançado, impõe pré-requisitos, exigindo-nos pensar, sentir e agir em consonância com esses requisitos.

Quanto mais estejamos em conformidade entre o que se nos pede e o que fazemos nesse sentido, mais facultaremos a instalação do bem-estar desejado, e, por conseguinte, mais vamos nos distinguindo do lugar comum onde predomine o desequilíbrio, tornando-nos singulares.

Acrescentemos ao nosso objetivo existencial estilo de vida saudável, praticando valores como sobriedade, comedimento, solidariedade, fraternidade, tolerância, compreensão, respeito, amor ao próximo, humildade e tantas atitudes mais dessa mesma natureza elevada e não só sentiremos bem-estar confortando o coração, como também estaremos vivenciando a individuação!

Fazer parte de todo o conjunto de indivíduos pertencentes à mesma sociedade, sim, porém, primar em manter ativos os objetivos próprios, executados de acordo com a tendência interna, em diversas metas propostas, é o modelo.

Seguir esse modelo com fidelidade, é ação característica da imensa bagagem vivencial que todos trazemos, ao longo de todas as experiências, nos diversos aspectos que possamos colaborar.

Essa peculiaridade de podermos expressar em atos tudo o que seja relativo ao nosso nível de entendimento sobre as diversas questões do momento-vida atingido, é o que nos difere dos demais – individuação – porém, atuando sempre no trabalho comum de construção de um mundo melhor para todos.Tal é o patamar de seres humanizados.

Segundo o grande psicanalista Carl Jung: A questão não é atingir a perfeição, mas sim a totalidade.

Naturalmente, com empenho, vamos nos fazendo únicos, apartados do comum, individualizados, desprendidos da alma-grupo do mesmismo reinante, fazendo de cada experiência, aprendizado, o que é de grande valia para todos aqueles que nos decidirmos à compreensão de nós mesmos.

Individualizarmo-nos depende de nos conhecermos, de nos aceitarmos diante da nossa realidade pessoal, de nossos valores, de nossas crenças, superando-nos sempre. Enfim, o que somos, de fato, nesse momento-vida.

O que desejamos ser é expectativa, que pede construção.

O que imaginamos ser é ilusão, que pede reconsideração.

Rumi, poeta e mestre espiritual persa do século XIII, recitou:

Seja como o sol pela graça e misericórdia,

Seja como a noite para cobrir as faltas dos outros,

Seja como a água corrente pela generosidade,

Seja como a morte para a raiva e o ódio,

Seja como a terra pela modéstia,

Pareça ser aquilo que você é

Seja aquilo que você parece ser.

Ainda segundo Jung: O objetivo da individuação é nada menos que despir o self dos falsos invólucros da persona...

Reformular regras de bem proceder, para melhor, moralizando-nos assertivamente, carregados de boa intenção para conosco mesmo e para com os outros, principalmente.

Mudar o que precisar e aprimorar o que já for bom.

A todo momento, o mundo e nós somos renovados. No entanto, não temos consciência desta eterna renovação. A vida, como uma corrente de água, é sempre renovada, embora se revista de uma aparência de continuidade em sua forma.

Somente conseguimos mudar o que primeiro formos capazes de ver e entender sua validade, sua conveniência, sua importância, sua ecologia.

Renovar é ação que se desenrola em nosso coração, que se dá como com a semente que, em silêncio, evoluciona em direção à Luz.

Rumi, o poeta persa, nos diz, com a sabedoria de quem sentiu em si mesmo experiência com o divino na vida, o que lhe deu endereço certo da Luz Perene: assim como o coração é a luz que confere brilho ao olhar, é a luz de Deus que confere brilho ao coração. E disse mais:

Bata, e Ele vai abrir a porta

Desapareça, e Ele vai fazer você brilhar como o sol

Caia, e Ele vai levantá-lo para os céus

Torne-se nada, e Ele vai transformá-lo em tudo.

Tal originalidade e individualização pessoal, quando insculpida no âmago de nosso ser, não isola e nem aparta; contrariamente, revela e enaltece a interdependência com o próximo e com a natureza, pois é reconhecimento advindo do autodescobrimento, um autoencontro com a verdade que liberta, com a nossa identidade real.

Não nos faz egoísta, deixamos de sê-lo.

Não nos faz orgulhoso, deixamos de sê-lo, pois conseguimos ver nossas próprias falhas e as percebemos nos demais, mas com vontade de colaboração, não com crítica destrutiva.

Passamos a ser espontâneos, autênticos, naturais, simples, diante da lucidez em nós e por nós despertada.

Vamos formando nossa marca registrada.

Numa prateleira de mercado encontramos várias marcas de um mesmo produto. Estão juntas, não misturadas. Cada uma com suas características, suas qualidades.

Uma boa marca é uma conquista, que, no meio das demais, faz a diferença, destacando-se pelo que é, não pela semelhança com outras.

Individualista difere de individuação. Individuação é conquista construída em nível superior de consciência. Individualista é codinome de egoísta.

Momento da individuação, é aquele no qual o Espírito comanda a matéria, e o psíquico mantém-se em harmonia com o físico.

Num jardim, flores diversas, cada uma exalando seu próprio perfume.

Na árvore, diversos frutos, todos vindos da mesma semente, mas cada um se fez único em tamanho, fartura de polpa e gosto adocicado. E a qualidade da semente que carrega em si, manterá o ciclo da vida.

Essa jornada é que nos leva da posição de indivíduos que todos somos, inicialmente, para o nível desejado da individuação, onde só se chega quando se quer e se empenha para isso.

Não basta saber da importância dessa conquista pessoal e que isso é finalismo existencial, onde teremos de chegar, mais dia menos dia. É preciso fazer por donde, pois entre saber e fazer há um abismo, que só é transposto pela ponte chamada vontade, no momento que se fizer agora.

À medida que adotamos valores pessoais esplêndidos, nos retiramos do comum, transformando-nos, do mesmo modo quando a flor se converte em fruto iniciante.

Vamos nos alocando no estado de completude, assim como o fruto segue rumo ao amadurecimento.

Conforme Jung, quando as funções psíquicas – sensorial, sentimental, intelectual e intuitiva – estiverem em perfeita harmonia, o fruto terá amadurecido, teremos atingido a singularidade, a individuação.

O contorno delimitador e constrangedor do “eu” se dilui, qual se fora pintado com a técnica sfumato adotada por Da Vinci.

O ego se submete ao self, levando-nos a assumir a nossa identidade transpessoal, real, humilde.

Já sem pano de fundo no palco da vida que crie ilusão de ótica, somos, simultaneamente, autor, diretor e ator em cena; somos o cenário e a ação; o script e a manifestação do personagem, sem máscaras, despidos de ilusões e truques. Somos a peça, o palco e o teatro, o público; somos observadores observados.

Simplesmente pertencemos, como a gota de água na corredeira de um lago. É gota e ao mesmo tempo é lago. Ela flui e se deixa conduzir, sem opor resistência, certa de que alcançará o mar.

A sensação de pertencimento se assenhoreia de nós, e nossos sentidos e funções psíquicas se veem integradas na Consciência Cósmica, que sempre esteve presente e nela sempre estivemos mergulhados, mas somente agora sentida, porque antes não encontrava registro em nossos sentidos, então amortecidos e adormecidos em níveis primários da consciência, do sono sem sonhos.

Nossa consciência desperta, nossa mente expandida, nossos sentidos agora aguçados e sensibilizados pelas sutilezas sublimadoras que o autodescobrimento nos traz e que promove o estado singular da individuação, nos dá a reconhecer e usufruir a chegada natural e espontânea daquele modo de sentir que tudo é um, tudo é cada um e tudo possui uma consciência superior que mantém contato com tudo, com todos e com o grande Todo, envoltos numa mesma energia, benfazeja, vivificante.

Quanto mais sedimentarmos em nós valores espirituais, aqueles que transcendem o “ter coisas” e primam pelo “ser sempre mais e melhor”, mais significação, nobre por excelência, teremos, tanto para nós próprios, como para o próximo e para a Vida.

Essa jornada interior de autossuperação e suplantação de limites, rumo ao estado de completude, individuação, bem-estar, felicidade, saúde plena, pode ser vista como um rio em sua trajetória rumo ao grande mar. Ele alcança seu destino, cumprindo sua função junto à vida, à natureza, contornando cada obstáculo, seguindo adiante, resiliente que é.

Flexível, o rio segue por caminhos de acordo com o que o meio onde existe lhe oportuniza, sem perder de vista seu objetivo primordial: vir a integrar-se ao portentoso oceano, se fazendo um com ele.

E você? Quando vai começar aquela longa jornada para dentro de si?, questiona-nos Rumi.

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